Sobre “Jóquei”, de Matilde Campilho
Jóquei, da escritora portuguesa Matilde Campilho, é um livro apaixonante. A propósito, é a sua única obra, suficiente para consagrá-la no universo das letras.
O título nos transfere à sensação de movimento: jóquei é um esporte em que corremos com nosso cavalo e saltamos obstáculos; nos versos da autora, ao lado de toda essa corrida, também somos capazes de apurar os olhos e perceber tudo ao nosso redor:
“Alguém cantando a canção sul-americana/Alguém afagando o pescoço do pombo sem dono/Alguém jogando a bola de tênis contra a parede do quarto, repetidamente, repetidamente, repetidamente”.
O título parece-me apropriadíssimo, em virtude da cadência rápida dos poemas, que, subitamente, nos atingem em cheio com a entrega de Matilde.
Há uma necessidade de tudo dizer e tudo sentir, de escavar as minúcias, de desmembrar um semicírculo, de falar “sobre as redes de pesca e o perigo das redes de pesca”, de alargar “os braços das amendoeiras” e “dos jacarandás”, de expandir uma floresta para aproximar duas pessoas de mundos-cidades diferentes.
A raça humana é toda brilho

Matilde caminha pelas ruas de Lisboa, Rio de janeiro, Brooklyn – pelo mundo todo – se derramando sobre o amor, sobre a distância, sobre as descobertas mais preciosas da vida mais banal e, por isso mesmo, tão completamente bela, universal e humana.
Aliás, ela descobre que a “raça humana é toda brilho” e “no que depender do amor, para além da paixão e para além do desejo: ninguém mais se afogará”.
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E mesmo que cada detalhe seja perscrutado, desde as nossas caixas torácicas até os peixes do profundo oceano, eu diria que é uma obra mais sobre sensações, longe de se fechar na racionalidade.
Ao fim de cada verão, é importante sentir, entregar-se, “implica uma insistência nos mergulhos e uma desistência breve das respostas”. E assim descobrir tudo de novo, sempre com delicadeza, porque segundo Matilde, “a ternura é importante”. Eu concordo.
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