O impeachment de Micarla
Micarla de Sousa e Paulinho Freire: muito parecidos politicamente
Apesar da devastação e desesperança que legou a Natal em apenas dois anos de mandato, Micarla de Sousa deve continuar como prefeita. O seu impeachment, defendido com um certo voluntarismo juvenil nas redes sociais, principalmente no Twitter, não é a solução política para a cidade.
Por duas razões principais: daria o mandato ao vice Paulinho Freire, político acanhado e uma incógnita administrativa, de perfil conservador e alinhado ainda mais à direita; poderia ensejar uma vitimização de Micarla, uma política forjada de forma artificiosa pelo marketing, mas com domínio da demagogia e que poderia sair fortalecida do processo.
Por isso, não faz sentido o “fica Paulinho” bradado por alguns nas redes sociais. O risco seria mudar para tudo continuar igual, conforme a famosa advertência empregada por Lampedusa em seu “O Leopardo” (“Se queremos que tudo continue como está, é preciso que tudo mude”).
Bebamos esse cálice amargo até o fim.
É possível que a gestão micarlista tenha um efeito didático, pedagógico mesmo sobre os eleitores. Principalmente porque corpinhos bombados e rostinhos bonitos já se insinuam para assumirem o lugar da atual prefeita na próxima eleição. Então, deixemos ela e sua troupe cumprirem até o fim o ciclo de desatinos para com Natal.
Confesso que me surpreende a dimensão do desastre administrativo municipal. Quando escrevi lá atrás, quando ela era ainda candidata, que Natal precisava passar por Micarla não imaginava o que estamos assistindo hoje. Nos bastidores, então, falam-se coisas absurdas e cabeludas sobre a prefeitura.
Num contexto desses os acontecimentos antigos e recentes envolvendo a Capitania das Artes não causam mais nenhuma surpresa.
Com quase 80% de rejeição a prefeita foi isolada politicamente. Não conseguiu eleger nem o marido e nem a irmã deputados. Deus não nos abandonou de tudo! Não conta mais com o apoio de parte dos partidos que a ajudaram a chegar ao Palácio Felipe Camarão. Principalmente do DEM, peça fundamental na sua eleição, que prepara a candidatura do deputado Felipe Maia. A mídia e os jornalistas que a apoiaram ou já partiram para a oposição pura e simples ou silenciaram. Chegou-se ao ponto do voraz PMDB recusar participar do secretariado municipal. Por aí, se tira o desgaste insanável da prefeita.
Felizmente, a gestão micarlista não precisou de oposição. E ainda bem, porque a indigência – e a má fama – política da Câmara Municipal de Natal é de estarrecer um São Tomé. Micarla e seus secretários e assessores cuidam de fazer oposição a si próprios.
Não passa uma semana sem uma trapalhada, uma medida impopular ou nebulosa, que demonstram até para os mais céticos o fundo do poço a que chegou a atual administração. Exemplos recentes não faltam, como o polêmico reajuste das passagens municipais, a contratação por R$ 180 mil de uma empresa de Brasília para fazer o site da Prefeitura, os reajustes exorbitantes de IPTU. E por último, a trapalhada que quase lhe custou o mandato – o afastamento da Prefeitura por prazo superior a um mês sem licença prévia da Câmara, conforme exige a Lei Orgânica do Município.
A troca quase mensal de secretários renderia um artigo à parte.
Tudo isso teria alguma comicidade se a conta não fosse rateada entre todos nós e se não conduzisse à cidade ao seu pior momento em décadas.
Micarla de Sousa conseguiu inverter até a máxima de Maquiavel, de que o mal deve ser feito de uma vez e o bem aos poucos. Até hoje, passados dois anos, a cidade ainda espera por algum bem. TC
Tácito só tem você meu broderr..um monte de gente já tentou destrinchar esse balaio de gato e não consegiu de forma tão brilhante como voc~e faz agora com seu texto impecável..isso é coisa de vc,, e adriano de souza tá certo vc precisa escrever mais e mais e nos presentear. valeu ..alexandre
Tácito, parabéns pelo texto primoroso. Manifestei, diversas vezes, minha opinião contrária ao impeachment de Micarla. Defendo que a prefeita deve sentir nas urnas a manifestação da reprovação popular. Talvez, só assim, quando não lhe restar mais nenhum artifício de marketing, ela se dê conta da própria inépcia para o cargo e do abismo político em que se encontra.
Temos, apenas, que o “efeito pedagógico” a que você se refere seja só utopia. Nossa sociedade é politicamente imatura. O preconceito é algo mais arraigado do que supõe nossa vã filosofia.
Vide o que aconteceu no segundo turno da eleição presidencial de 2010, quando Dilma Rousseff foi derrotada em Natal devido a onda de boatos fascistas/religiosos.
Outro exemplo é a sequência de derrotas da deputada federal Fátima Bezerra (PT) nas disputas pela Prefeitura de Natal.
Em vez de competência, seriedade e ética, a maioria valoriza abstrações como carisma, simpatia e até mesmo beleza como atributos definidores do seu voto.
Enquanto o povo pensar dessa maneira, estamos constantemente sujeitos ao aparecimento de novas Micarlas.
Eita, píula!
[Texto importante]
Tácito,
baita texto.
Mas é duro constatar: no laboratório em que se fabricam determinados cálices o fundo do poço não existe.
Parece que a Capitania de João de Barros foi escolhida para os mais tresloucados experimentos do satânicos doutores.
Grato pelos filmes que me indicou.
tem toda a razão. paulinho freire seria mais do mesmo.
Sábias palavras!