‘Poemas haikai’
PROSA E VERSO – O GLOBO
O sueco Tomas Tranströmer, vencedor do Nobel de Literatura 2011, não tem (ainda) nenhum livro disponível no Brasil. Segue abaixo “Poemas haikai”, única poesia do autor publicada por aqui. O poema integrou a edição 26 da revista “Poesia Sempre” (2006), da Biblioteca Nacional, dedicada à literatura sueca e editada pelo poeta e tradutor Marco Lucchesi. A tradução deste poema é de Marta Manhães de Andrade.
POEMAS HAIKAI
Tomas Tranströmer
“Os fios elétricos
estendidos por onde o frio reina
Ao norte de toda a música
O sol branco
treina correndo solitário para
a montanha azul da morte.
Temos que viver
com a relva pequena
e o riso dos porões
Agora o sol se deita.
sombras se levantam gigantescas
Logo logo tudo é sombra.
As orquídeas.
Petroleiros passam deslizando.
É lua cheia.
Fortalezas medievais,
cidade desconhecida, esfinges frias,
arenas vazias.
As folhas cochicham:
Um javali está tocando órgão.
E os sinos batem.
e a noite se desloca
de leste para oeste
na velocidade da lua.
Duas libélulas
agarradas uma na outra
passam e se vão
Presença de Deus.
No túnel do canto do pássaro
uma porta fechada se abre.
Carvalhos e a lua.
Luz e imagem de estrelas silentes.
O mar gelado.”
Nina, talvez já conheça este poema ‘fisgado’ do Língua do Pé (blog de Nonato). Também de lá cheguei até Cida Moreira cantando Back to Black.
Elegia
Abro a primeira porta.
É um enorme quarto repleto de sol.
Um caminhão passa pela estrada
e faz com que a porcelana estremeça.
Abro a segunda porta.
Amigos! Bebestes da escuridão
e tornaste-vos visíveis.
Terceira porta. Um estreito quarto de hotel.
Vista sobre um beco.
Uma lanterna que brilha no asfalto.
Descobertas: belas escórias.
Sämtliche Gedichte ( Poesia completa ), Edition Akzente Hanser, 1997, tradução do sueco para o alemão por Hans Grössel. Trad. p/ português: Luis Costa
Entre a magia e a servidão diária, é onde o homem se situa. A poesia é a sua janela.Obrigado, Nina, pela indicação do blog “Poesia Ilimitada”.Muito bom.
mais poemas traduzidos aqui: http://poesiailimitada.blogspot.com/search/label/TOMAS%20TRANSTR%C3%96MER
Evé, jarbas! pena eu não saber quem traduziu, peguei lá no facebook. Um beijo.
Fico feliz quando vejo o trabalho de um poeta ser universalmente reconhecido..Belos os poemas de Tomas Transtromer que você postou.Um brinde, poetisa Nina Rizzi !!!
Para fechar esta bela noite, só um poema (ou poemas) como este(s) de Tomas Transtromer, traduzidos por Marta Manhães de Andrade.Este poeta do ocidente, em seu culto ao hai-kai, forma poética nascida no Japão, une-se a Jorge Luís Borges.Lastimável que o argentino não tenha conquistado também o Prêmio Nobel.Viva a Poesia.
Através do bosque
Tomas Tranströmer
Um lugar chamado pântano de Jacob
é a cave fresca de um dia de Verão
luz que coalhando azeda uma bebida
com gosto de velhice e de pobreza.
Os frágeis gigantes estão entrelaçados
tão densamente que nada pode tombar.
A bétula partida apodrece ali mesmo
em posição vertical como um dogma.
Do fundo do bosque vou subindo.
Brilha luz cada vez mais por entre os troncos.
Chove sobre os altos telhados que me abrigam.
Sou um longo escoadouro de impressões.
Na orla do bosque o ar é doce. –
Grande, escuro pinheiro voltado para o longe,
de focinho escondido na terra
bebe a sombra da chuva.
PÁSSAROS MATINAIS (1966) – Tomas Tranströmer
Desperto o automóvel
que tem o pára-brisas coberto de pólen.
Coloco os óculos de sol.
O canto dos pássaros escurece.
Enquanto isso outro homem compra um diário
na estação de comboio
junto a um grande vagão de carga
completamente vermelho de ferrugem
que cintila ao sol.
Não há vazios por aqui.
Cruza o calor da primavera um corredor frio
por onde alguém entra depressa
e conta como foi caluniado
até na Direcção.
Por uma parte de trás da paisagem
chega a gralha
negra e branca. Pássaro agoirento.
E o melro que se move em todas as direcções
até que tudo seja um desenho a carvão,
salvo a roupa branca na corda de estender:
um coro da Palestina:
Não há vazios por aqui.
É fantástico sentir como cresce o meu poema
enquanto me vou encolhendo
Cresce, ocupa o meu lugar.
Desloca-me.
Expulsa-me do ninho.
O poema está pronto.